terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Efêmera eternidade

Rasgaram as costas dela quatro ossos que cresceram cobertos de penas cor de madre pérola...
Os olhos dela, de cor e brilho de diamante, enxergavam um buraco na parede que revelava um pedaço de céu estrelado de amarelo.
O livro das horas aberto sobre as pernas dela sussurravam um segredo.
Ela sabia que o infinito era uma distância, um espaço e um tempo que deviam ser respeitados.
Uma manga amassada melava sua mão esquerda. E o cachorro deitado em seus pés sonhava com ossos de algodão-doce.
Na mão direita ela segurava o mundo como se fosse feito de gelatina... e brincava com esse mundo e suas vidas tão desnecessariamente complexas...
Os cometas passavam por ela tirando seus chapéus de forma respeitosa.
O Diabo a tentava seduzir diariamente fazendo cócegas em seus joelhos...
Ela ria com uma malícia de prostituta e inocência de recém-nascido.
Nunca pedia nada com lábios, mas exigia tudo sempre com o pensamento.
Cada vez que ela batia um pé no chão o mundo inteiro entrava em um estado de êxtase tão intenso que no segundo seguinte as pessoas se esqueciam da maravilhosa sensação.
Da ponta de seus cabelos negros nasciam chamas que nunca queimavam ou apagavam.
Ela morava em um reino, constituído apenas por um castelo de água e um trono de maçãs das mais vermelhas. O chão era todo decorado com cacos de vidro.
Seu vestido era feito de inúmeros delfínios azuis e sobre sua testa havia o desenho de uma espada medieval.
Seus pés estavam sempre descalços.

Enquanto ela passava aquela eternidade imperceptível brincando com o mundo de gelatina em seu reino, o mundo e suas vidas iam consumindo cada uma das energias dela, conduzindo-a à morte de forma lenta e imprevisível.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Frenesi

Eu preciso escrever, preciso escrever, preciso escrever.
Eu preciso, mas não consigo.
Há essa ânsia incessante, mas não consigo vomitar.
O estômago revirado, a tosse, a ânsia. Mas nada sai daqui de dentro para alívio meu.
Uma pressão no peito e um nó na garganta, uma cabeça quente e pensamentos frenéticos. Mas tudo desconexo.
Estou perdida e me perdi. Perdi os pensamentos e os sentimentos.
Tudo parado no fundo da boca, na ponta dos dedos, no bico dos seios.
Um tesão sem válvula de escape. Coito interrompido.
Um tapa de ódio sem som.
O grito de um mudo. Um elevador em queda constante, sem chão.
Preciso escrever para desabafar, desabar, desopilar, degringolar...
Mas está tudo contido aqui dentro. Uma massa sólida cheia de calor querendo explodir.
O orgasmo que ameaça chegar mas não acontece nunca.
Preciso escrever mas estou muda de idéias.

Venho sofrendo de um abandono de sentimentos.
Irônico pensar que um dia isso era tudo o que eu queria. Esse abandono de sentimentos, de sentidos, dos outros, de mim mesma.
É como se acordar, trabalhar, comer, dormir, acordar, trabalhar... já não fosse tão ruim.
Simples assim, ligada no automático. Pensando em casar com um marido bom e ter filhos saudáveis e lindos, com eletrodomésticos de última geração, como em um filme de American Dream... Sonhos de mulherzinha.

Às vezes acho que essas “mulherzinhas” são mais espertas do que as mais cults e cools das intelectuais de beleza exótica.
Pois elas se enfeitam e se perfumam e se arrumam e fazem as unhas e tingem e alisam seus cabelos para parecerem a nova Barbie de suas sobrinhas e filhas. E se fazem de burras e indefesas. E com essa aura de princesas dobram o mais beatnik dos homens e os domam. E casam com o dinheiro deles, e os engordam, ou não, e os traem com o jardineiro, com o encanador, com o sapateiro e com o cabeleireiro. E ganham carros e mimos de meninas ricas por esse “bom” comportamento que não exige esforço nenhum além de se manter bonita e dar bem dado para esses trouxas.

É. Essas mulherzinhas de cabelo esticado e unhas inquebráveis são mais espertas e felizes.

O amor é um luxo dos que não têm ambição...

Ai, se ele soubesse o quanto eu gosto dele e o quanto eu queria que ele gostasse de mim. Mas ele só olha para essas mulherzinhas.

Acho que vou passar a me apaixonar por mendigos... já que ando mendigando por amor...

Não sei se me recupero do próximo tombo.
Sei que não quero mais nenhum tombo... quero aprender a voar definitivamente.

Preciso de um calmante para essa minha taquicardia constante e minha vida anda precisando de mais momentos bonitos.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

"Eu te amo, eu te amo, eu te amo,
mas você não me dá bola.
Eu vou me afogar
num copinho de coca-cola."

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Inutilidade Pública

As coisas estão indo...

Estou assim assim...

Sábado vou na praça Roosevelt gastar mais do dinheiro que não tenho e tentar esfriar a cabeça pela semana inteira.

Tomara que eu conheça alguém que valha a pena, para dar uma virada nessa vida surreal.

Tomara.

Eu queria ser paga para escrever... eu queria ser paga para atuar... eu queria ser paga para fornicar...

Isso sim seria trabalhar por prazer.

Preciso procurar um emprego novo mas não tenho vontade. Preciso conhecer alguém novo mas não tenho vontade.

Preciso ter vontades mas não tenho vontade.

Queria dormir para sempre... Passo os dias torcendo para que uma Tsé Tsé venha me pegar e eu possa dormir para sempre sem ser acordada.

Acordar, trabalhar, comer, dormir... todos os dias.

Sei que viver não é só isso. Não pode ser.

É porque isso não é viver.

Viver é ver um eclipse do alto de um prédio alto numa madrugada fria.

É não ter compromisso com as horas.

Envelhecer é uma regra sem exceções.

As exceções são para os fracos.

Mas o que é ser forte ou fraco quando não há parâmetros?

As histórias não se repetem pois são individuais. Portanto, não há parâmetros.

Preciso arrumar um emprego real. Uma vida real. Não essa coisa virtual que trata seres humanos como números e números como seres humanos.

Tenho que dar “graças a Deus” por ter um emprego em terra pobre? “Todo império perecerá”.

Não quero ser ingrata com a vida. Mas é que vejo a vida sendo ingrata com os sentimentos de algumas poucas pessoas boas.

Não quero dizer que sou boa. Nem má.

Estou bem longe do ideal. Estou bem longe de qualquer coisa ou pessoa.

Estamos todos longe. Cada vez mais longe. As famílias viraram corporações. Restam só as relações de interesses. As pessoas se aturam. Abandonam quando os problemas aparecem. Se distanciam, ficam frias. Mudam de estratégia, arrumam ocupações. Idealizam e amam o que idealizaram. Assim é muito fácil.

O amor está em extinção. O ser humano deveria entrar em extinção.

Se as formigas tivessem em torno de 30 cm de altura, tamanho de um cachorro pequeno, elas dominariam o mundo. Se nunca uma pessoa tivesse matado uma barata na vida, andaríamos pelas ruas com baratas amontoadas até a altura de nossa cintura.

Um pouquinho mais de cultura inútil para vocês comerem com arroz, feijão e farinha.

Todos acreditam serem especiais ou melhores do que os outros, mais inteligentes. Mas a ética diz que ninguém é melhor do que ninguém... Ou é a moral que diz isso?

Self love... is there a limit?

Well, the sky is the limit…

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Early years

Once upon a time, some guys woke up and said:

“Hey Jude, don’t let me down.”
“Don’t carry the world upon your shoulder...”
“Take a sad song and make it better.”

A little time after that I passed away.
I saw them grow, I saw them get wasted, I saw them hold my hand.
I saw the sky go purple, I saw Lucy appears in the sky with diamonds…
I saw the times run through my skin, while I chose to stop in a time spot.
I saw all the beauty of the world and I saw the war.
I spoke words of wisdom…
I had extreme freedom. And I had extreme love.
And I was stupid enough to let it all behind in early years…

Now I’m here again…
Without freedom, without love.
Without time to be me. Carrying the world upon my shoulder.
Trying to make any sad song into something better.

Anyways, someday, not yesterday, there will be an answer…
Let it be.

http://www.youtube.com/watch?v=4oZYqAeIdYk&feature=PlayList&p=FFFB73B014B9604A&index=3

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Velocímetro

As pessoas andam sem tempo para parar.
Sem tempo para pensar...
Na rua aceleram os carros na minha direção, na sua direção, e não notam o que vêem...
Não notam o que passa por elas em velocidade de velocímetro.
Ando a pé para sentir tudo diferente dessas pessoas.
Para ver tudo diferente dessas pessoas.
Para realmente ver.
As pessoas andam sem tempo para parar.
Aceleram seus carros em minha direção. Na contramão.
Na minha contramão, na sua contramão.
Em qualquer direção.
Não param para olhar. Sem tempo para pensar.
Ando a pé. Sem retrovisor ou acelerador.
Passo pelas pessoas em velocidade de velocímetro.
E já não noto o que passa por mim.
Porque também não me notam quando passo.
O meu passo no meu espaço.
O marcapasso pulando descompassado no peito do ataque cardíaco.
Sem tempo para parar, sem tempo para pensar, acelerado, descompassado...
Palpitações em velocidade de velocímetro...
Rápido assim, fulminante.
O peito no passo do marcapasso...
Um passo em falso, certeiro e definitivo. Em velocidade de velocímetro.
E nós já não vemos mais o que passa por nós...

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Uma lenda no cortiço do centro da Terra

No Big Love.
Not even a small one.
No emotional sensations.

Just this solitude…
Just this lack of inspiration.
This lack of happenings…

This emptiness that won’t leave me…

Um coração do avesso pendurado no varal de um cortiço.
Os meninos que jogam bola batem no coração com madeira cheia de farpas quando passam correndo...

Uma menina com um buraco no peito que mostra o outro lado da rua.
Já cega, por ter os olhos secos de tanto chorar.
Seu útero abandonado de carinhos não gera mais nenhuma vida.

O espelho a olha com desdém.
Enquanto sua pele tem cheiro de cravo, canela e manjericão.
Suas mãos de criança seguram uma coroa de espinhos.

Ela está nua, coberta apenas por purpurina furta cor.
Em suas costas duas asas pararam de crescer.
E seus pés sangram pelas solas criando um rio vermelho que deságua na boca de um dragão.

Um cavalo dá coices em quem se aproxima.
Uma árvore cresce em volta dela, em espiral.
Um furacão nasce de sua cabeça e suas palavras são jorradas como lava quente em húngaro.

O coração se despedaça tingindo todo varal de vermelho e lilás.
Os meninos não cessam o futebol.
E a menina volta ao centro da Terra.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Em meio às risadas e transeuntes

O tempo corre inadequadamente... desengonçado.
Enquanto isso eu vivo esperando os dias passarem de final de semana em final de semana.
E essa semana se inicia.
Mais uma semana de conta-gotas. Conta-dias.
Enquanto isso essa dor inexplicável me acompanha.
Essa dor física que se mistura à dor emocional.
Nada a ver com nenhum amor bandido.
Apenas umas amarguras aqui e outros nervos presos ali e pronto!
Meu corpo travado do rim ao calcanhar, em forma de cólicas em forma de choques.
E tudo o que tenho vontade é de sentir o sol na pele e caminhar sozinha pelas ruas de sampa na madrugada.
Mas a chuva me atrapalha e se atrapalha e atrapalha todo trânsito da cidade.
Eu insisto em voltar pra casa. E insisto na família.
Mas amar alguém só traz preocupações. Mesmo que esse alguém seja minha mãe.
Meu corpo reclama até o ponto de quase desmanchar. E de repente silencia. Se cala.
Daí não sinto nada nem penso nada.
Apenas assisto às pessoas que passam. Apenas ouço as risadas.
Mas não faço parte.
De repente um abraço me traz um conforto inesperado.
Era tudo o que eu queria.
Meu corpo sente e chama o abraço mais uma vez. Mas ele não volta.
Eu me calo esperançosa.
Penso em tudo de novo.
E desisto da minha esperança.
A dor revisita repaginada.
Ainda do rim ao calcanhar, mais fraca, mais chata.
Meu cérebro se concentra nela.
Os remédios desconcentram meu cérebro.
E eu vegeto em meio às risadas e transeuntes.
A pressão cai e os vestidos longos ficam mais brilhantes, mais coloridos.
Os sorrisos mais amarelos.
Meu corpo cala.
Já não me mexo mais.
As pessoas me perguntam o que eu tenho e eu já não tenho mais paciência para explicar.
A horas passam em conta-gotas. Conta-horas.
E eu só queria ficar sozinha.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Half life

Hoje é sexta feira.
Ainda sem chuva. Mas com promessa de pequenas pancadas à tarde.
Amanhã, sábado ensolarado.
É o que diz a previsão.
Hoje tenho um milhão de coisas para resolver no trampo.
Mais outro milhão de coisas para resolver fora do trampo.
Mas tudo o que quero é deitar numa rede confortável, ler meus livros favoritos, ouvir minhas músicas estranhas, brincar com meu cão Bob.
Ou tomar sol até arder a pele.
Porque pra mim tem que ser tudo assim, intenso!
Até doer, para parecer que é verdade.
Senão fico pensando que é tudo um sonho.
Odeio essa sensação de coisas half lived, if you know what I mean...
Mas sempre acontece uma coisa para estragar. Ou chove imprevisivelmente, ou a pele descasca.
E tudo desanima.
Mas amanhã é sábado e tem sol.
Amanhã é dia de volta às aulas malucas de teatro que eu tanto amo.
Amanhã é dia de me acabar no centro da cidade, entre os artistas e os palcos, e umas garrafas de um bom e velho Jack. Oh yeah...
Seja sentadinha na escada da praça ou bailando salsa com o Chaves e o Chapolin a noite inteira.
Adoro a imprevisibilidade de certas noites...
Adoro alguns poucos que me acompanham ou proporcionam essa tal imprevisibilidade.
Deus nos ajude e me proteja, pois o mundo está em quarentena.
Até a páscoa.
They've opened the gates.
Very few people can understand that.
Sábado do teatro, de matar a saudade, de vivenciar outras vidas no meu corpo.
Sábado das vitórias régias e dos Jack Daniels...
Sábado ao lado de velhos beatniks, grandes escritores e novas histórias.
Ah! Enfim sábado!

De alhos para bugalhos...
Tive um sonho estranho.
Sonhei que me deram uma tartaruga de nome Pipi, que não tinha casco e conversava comigo com uma voz fininha, tipo de desenho animado.
Ele era muito inteligente e muito verde também. A pele dele não era enrugada, era bem lisinha, como se fosse de borracha.
Apesar de ser uma tartaruga ele se movimentava de forma muita rápida, tinha uma personalidade incrível e um excelente senso de humor.
Pipi era uma graça.
rsrsrs
Daí, prometi a Pipi um lar. Disse a ele que ele ficaria solto no jardim e comeria todas as flores que quisesse. Disse a ele também que para que minha casa ficasse completa só faltava eu ganhar um pássaro e um gato.
Porém, quando cheguei em casa meu pai tinha destruído todo o jardim e cimentado tudo!
Eu não conseguia achar o Bob nem a Lila (meus dogs).
Comecei a chorar igual criança e fui embora dizendo que ali não tinha lugar para mim ou para Pipi.
rsrsrsrsrsrs

Deve ser por essas e outras que assusto quem se aproxima de mim.

As pessoas me condenam pelas minhas loucuras, pela minha infantilidade, pela minha entrega, pela minha ingenuidade... pelas minhas bobeiras.
Mas eu condeno quem não é autêntico ou fiel a si mesmo!
Aqueles que vivem com medo do que os outros vão pensar e medem suas palavras e gestos o tempo todo.
Aqueles que agem tentando fazer com que os outros gostem deles.
Conheci muita gente assim em 2007. Em um lugar e em pessoas que eu nunca imaginaria que seriam assim.
Mas ninguém se salva, não é mesmo?
Todos buscam agradar. Cada um a sua maneira.
Eu não tenho mais paciência para agradar.

Há poucas pessoas verdadeiramente brilhantes nesse mundo.
E elas se escondem.
Há muita pagação de pau por aí...
E muitos oportunistas.

Portanto, tudo o que vocês lerem por aqui é verdadeiro.
É fiel ao que sinto e o que sou.
E não vale a pena ler só hoje, ou só esse texto.
Vale a pena ver isso aqui desde o primeiro texto.
Cada reflexão, cada bobeira, cada depressão, cada euforia.
Cada acontecimento.
Cada um de vocês está aqui, nesses textos.
Declaradamente ou não.
E se estão aqui comigo é porque de alguma forma, ou de todas, são muito importantes para mim.

Agradeço imensamente a todos aqueles que um dia comentaram aqui.
Adoro seus comentários. Me inspiram, motivam, me modificam.
Agradeço àqueles corajosos que entraram nas minhas viagens e postaram alguma reflexão, algum elogio.
Algum "elogio à loucura" (citando Erasmo de Rotterdam) rsrsrs
Minhas loucuras, suas loucuras...
Juntando tudo numa coisa só.
Porque a vida é só isso.
E se não formos bobos, autênticos, intensos nas mínimas coisas, até eufóricos... it seems we are living a life half lived.
"Embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu"
Some of you guys know what I mean...

Now fuck off!
'Cause I've got a life to live.
And much work to do.

Küssen,

F.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

"Desperdícios"

Uma borboleta dança um ballet descompassado para o vento.
Uma senhora idosa sorri desdentada.
O café esfria no copo.
O sol brilha para a areia do deserto.
Uma criança canta em francês.
A menina rica que ganha um porsche ao fazer 18 anos e comprar sua carta.
O relógio acelera seus tic-tac's.
Uma linda poesia é roubada.
O beijo é rejeitado.
Um garoto asmático perde sua bombinha.
Uma menina com o rosto e o corpo queimados se olha no espelho todo quebrado.
O circo deixa a cidade enquanto o palhaço lava a pintura do rosto.
A televisão ligada durante a madrugada numa casa vazia.
As cordas do violão arrebentadas.
Lindos scarpins vermelhos esquecidos no fundo de um armário.
As ondas tocam silenciosas e mansas a areia da praia.
O jantar silencioso do casal maduro que rumina pensamentos e mágoas.
Flores raras e coloridas crescem em uma praia deserta.
Um avião desaparece no triângulo das bermudas.
A princesa persa que queria um castelo de chocolate.
A criança que vai ao chão inerte no encontro com uma bala perdida.
O pescador que não retorna do mar enquanto a esposa espera na pedra do cais.
A noiva que desiste do casamento a caminho da igreja.
Os olhares trocados com ele enquanto o vinho escorrega pela garganta.
Uma camisinha que estoura.
O silêncio que precede a chuva.
O executivo que nega moedinhas de cinco centavos ao moleque de rua e dá um colar de diamantes para sua amante.
A tinta escorre do quadro destruído pelo copo d'água desastrado.
A menina que gesticula com charme enquanto fala.
Os cães que uivam anunciando o terremoto.
Um homem que chora ao ver sua mulher quando volta da guerra.
Os médicos que contam piadinhas tomando café enquanto uma criança morre de tuberculose na fila de atendimento do hospital.
O satélite que sai da órbita e corre em direção à Terra sem controle.

Continuamos de olho...

Uma carta para ninguém

Um dia eu declarei que queria ser escritora.
Sentar no meio da Paulista ou no meio da neve vestindo um sobretudo vermelho com um notebook no colo...
Mas hoje não sei.
Não sei mais.
Acho que eu não teria a criatividade, imaginação de uma grande escritora contemporânea.
Assim como muitas outras que andam escrevendo por aí.

Imaginar ou lembrar coisas de minha própria história.
Até porque esqueço constantemente minha própria história.
Teria que criar lembranças, pensamentos, falas, atitudes...
Só vivendo. Vivenciando na minha imaginação.
Talvez eu consiga fazer isso enquanto atriz.
Mas enquanto escritora... minha atenção se perde fácil demais.

Talvez a vida esteja reservando algo realmente muito bom para mim...
Para essa falta de ações, de acontecimentos interessantes.
Talvez não.
Talvez só aquela sensação da chuva pesada que não vai passar.
Talvez só o dia nublado. Sem noites ou sol.

Como é que dizem? "o que é seu está guardado"
Mas será que possuo algo realmente meu?

Se escrevi no seu blog uma última vez foi para correr o risco de você me descobrir e eu nunca mais querer estar ali.
Nunca mais querer me pronunciar para você.
Nunca mais voltar ali naquele espaço tão seu.

Nunca mais te perturbar com a sensação da minha entrega e do meu amor.
Porque o meu amor eu sei que incomoda.
Eu sei que arde na sua pele.
Que sufoca.
E você não é forte o suficiente.

E eu sei o quanto só eu sei que sou sozinha.
E acompanhada e cuidada, por pessoas que um dia inevitavelmente vão me abandonar.
Pela idade... pelo tempo. Pela insanidade. Pela sanidade. Pela rotação e pela translação.

E eu sei o quanto não quero acordar todas as manhãs e tenho pressa dos acontecimentos.
Mas sei também do medo que tenho de adoecer.

E do medo que tenho de ficar sozinha.

Medo de te amar.
De te mostrar todo meu amor e tudo o que sou.
Medo da sua rejeição.
Medo de você ser brilhante demais... e eu de menos.
Medo de não estar a sua altura.
De não ser complexa como você.
De não ser simples o suficiente para você.
Medo de você conhecer alguém mais interessante, mais musical, mais inteligente, mais linda.
Mais talentosa.

Medo de estar ao seu lado mas ainda assim me sentir sozinha.

Medo de não te amar.

Medo de não ter uma personalidade incrível e inspiradora.
Não marcar sua vida nem um pouquinho.

Eu não te amo.
Eu não te amo.
Eu não te amo.

Não amo ninguém.

E isso é tão fácil.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

A menina que não eu...

Houve uma época na minha vida em que eu tinha tanta coisa pra falar.
Tanta coisa a realizar.
Tantos sentimentos bons para dividir. Com tanta gente.
Tantas esperanças. Sonhos.
Agora estou aqui.
Apenas olhando a passagem dos outros.
Eu, minhas olheiras, minhas roupas velhas e meu Ipod.
Nada a declarar.
Uma preguiça do mundo.
Tanta coisa errada. Tanta coisa boa.
E eu aqui olhando a passagem.
O batente da porta.
Os galhos ao vento.
Enraizada como uma velha árvore.
Sem saber aonde ir.
Sem saber por onde começar.
Com um pouquinho de medo de começar.
E ver tudo dando errado. Mais uma vez.
Por água abaixo.
Mas uma hora vai ter que ser diferente.
É difícil saber qual a hora certa.
Aquela brisa suave passa por mim também.
Uma criança canta em francês.
E eu só penso em comer sonhos de padaria.
O cheiro de chuva no nariz.
E meu provável amor cantando "Preta" para uma menina linda linda que não eu.
E o branco e o azul se misturando em meus pensamentos.
E Iemanjá me abençoando enquanto eu peço que ela me envie minha alma gêmea pelo mar, pelo ar ou pelo fogo.
Mas lembro que o fogo queima e arde e dói, como todos os outros amores que já passaram pelo meu peito.
E eu aqui sentada. Com minhas olheiras, meu Ipod e minhas roupas velhas, pensando o que vai ser do carnaval e o que vai ser de mim à toa por quatro dias.
Enfrentando pensamentos desenfreados.
Enquanto observo as vidas passeando em minhas retinas.
Enquanto o mundo gira e eu me enraizo.
Enquanto eu espero aquele abraço do cara que cantava "Preta" para a menina linda que não eu.