terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Tipo raro

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Ela tinha um tipo de câncer raro no coração. Só no coração. Não era dessas doenças generalistas. Era algo específico e raro. Era uma dessas doenças que deixam a pessoa bem cansada. Sem vontades. Sem ilusão também. Ela sabia que a vida era apenas um dia após o outro. Nada importava. Era tudo apenas sucessão de acontecimentos. Alguns eram bons, outros não. Ela sabia que o amor não existia, embora lá no fundo ela quisesse acreditar ou esperasse o contrário. Mas ela conhecia desde cedo as delicadezas de seu destino.Não conseguia mais acreditar em nada. Nem nela mesma. Então seguia caminhando por aí e se divertindo com amenidades. Conversando amenidades. Tentando sorrir quando recebia um sorriso. Mas nada além disso. E todos seguiam cobrando coisas dela. Porque uma coisa que ela aprendeu bem cedo era que sempre seria cobrada, por todos e por tudo, porque isso era tudo que as pessoas sabiam fazer. Cobrar e cobrar. Cobravam sua atenção, cobravam seu empenho, cobravam seu interesse, cobravam sua participação, sua opinião e sua alegria. Ela era generosamente egoísta. Mesmo acreditando que não era responsável pelas carências alheias, dava às pessoas tudo exatamente como elas queriam, só pra ver se, atingindo seus objetivos, as pessoas desistiriam dela. Seria tudo simples assim. Mas não era. Ela sempre era cobrada por mais e mais. Isso era bem difícil, simplesmente porque ela não queria reagir a nada e não achava as coisas e as pessoas tão interessantes assim. Ainda mais quando tudo e todos eram sempre tão carentes e desgastantes. Com seus egos sempre tão grandes, tão participativos e querendo mostrar opiniões relevantes e provar tudo o tempo todo. Ela só queria ficar na dela. Fazendo as coisas dela. Vivendo do jeito dela. E de vez em quando se divertir só um pouco com as coisas que aconteciam. Ela possuía um desses tipos de intensidade pra dentro. Não é um dos tipos de intensidade exibicionistas de pessoas que precisam provar que são intensas. É dessas intensidades que existem e dominam os donos, silenciando tudo, só para serem sentidas, geralmente levando à morte. Talvez por isso seu coração fosse sempre assim tão fraco.



segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Censurem-me com tarjas pretas

Às vezes eu realmente acho que vou conseguir acessar um mundo paralelo. Como quando eu sou a única pessoa no 15º andar que consegue sentir a mesa vibrando como se estivesse passando um caminhão no teto. Ou igual a quando eu olho pela janela do 15º andar e não sinto a altura nem o rítmo da cidade acelerada. Apenas vejo aquele monte de luzes e me permito alienar como todo o resto.

Às vezes essa outra dimensão é aquele lugar pra onde sou arremessada sempre que sinto saudade. Eu sinto muita saudade. Então faço apostas mentais em cavalos imaginários fervidos em suor, guiados por Jockeys sem rosto. Só pra ver se esqueço. Acendo um cigarro que não habita meus dedos e trago um gole do melhor uísque que ainda não foi destilado. Só pra me acalmar. Só pra me acalmar. Censurem-me com tarjas pretas.

Fico imaginando que bom que seria o verão se eu pudesse dançar sobre os trilhos dos trens que habitam as cabeças dos semideuses. Brincando de semideuses. Quando penso em você é do sabor do cigarro que me lembro. Quando penso em você é do perfume errado que me lembro. Agora quando penso em você, penso em rosas roubadas de pizzarias fechadas. Penso também em partituras musicais e pequenas cartas de suicídio. Lembro da bronca. Penso que o Rio de Janeiro pode realmente ser mais bonito.

Lembro da vontade de vomitar que me deu quando você começou a pensar que eu amava seu amigo. Mas eu não amava e era tudo tão óbvio que eu só queria que você calasse a boca e me comesse. Então pra você me comer eu disse e fiz tudo errado. Foi tudo tão em vão. Porque você, justo você, era perfeccionista. E eu me esqueci que eu nunca poderia ser perfeita, por mais que eu tentasse, não pra você. Desde então todos os meus outros relacionamentos, semi-relacionamentos, semi-sentimentos, semideuses, rolos, ficantes, qualquer coisa, são comparados a você. E só eu sei, bem lá no fundo daquilo que chamam de alma, que ninguém nunca vai superar. Como naquela música brega que insiste em dar voltas de ciranda no meu cérebro, fica o
disco riscado bem na parte do “nothing compares to you”. Fico buscando em todos os outros um pouco de você.

Lembro de como as imagens daquele dia ficaram tão fortes numa memória que quase não existe. Eu bêbada te chamando, você descendo a escada com uma garrafa na mão, enquanto todos seus amigos davam em cima de mim e eu deixava. E da cara do taxista assustado quando subi no seu colo e disse que queria fazer tudo com você bem ali. Tudo que você quisesse bem ali. Só pra você entender que eu tinha escolhido você, não o seu melhor amigo. Era só você. E que aquela minha rebeldia toda era uma tentativa retardada de dizer com todos os poros o quanto eu queria ouvir eu te amo brincando na sua boca. Então eu fiquei presa na sua calçada, ali entre o batente da porta da sua casa e a porta do taxi. Com seu beijo entalado na garganta. Com a lágrima que nunca apareceu e a confusão de sentimentos que nasceram nos meus olhos, nos meus gestos e nas minhas durezas. Eu nunca mais voltei nem fui a mesma.

Tive que partir. Viajei e voltei. Mas em algum lugar entre você, o batente da porta, a porta do taxi, os erros na sua cama e o orgulho do seu melhor amigo, eu te perdi. Te perdi pro mundo. Pra todas aquelas dores e decepções de ilusões que você criou quando eu secretamente pedia apenas que você aceitasse minhas imperfeições. Logo eu que sempre acreditei com todas as minhas forças que tinha todo o direito de ser imperfeita. Eu só não esperava te encontrar.

Desde então tudo o que escrevo é pra você. Tudo o que sinto é pensando em você. Você me deu a consciência do quanto minha vida pode ser irreversível. Não importa quantas vezes eu volte. Não importa nem o número de vezes que eu substitua cada uma das minhas carências. Você está impregnado, é fato, é irreversível e você sequer merece tudo o que eu sinto. Desde então faço apostas mentais em cavalos imaginários fervidos em suor, guiados por Jockeys sem rosto. Só pra ver se esqueço. Acendo um cigarro que não habita meus dedos e trago um gole do melhor uísque que ainda não foi destilado. Só pra me acalmar. Só pra me acalmar. Censurem-me com tarjas pretas.

Eu sinto muita saudade. Mesmo quando sigo insistindo em amar todos os outros homens.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Meu sol de azulejo

Sorte de realejo para acalmar o pensamento.
Está longe de ser a história ideal.
De começo atropelado. Enredo teimoso.
Mas é o que satisfaz o presente. Até quando só eu acredito que ele é presente.
Meu presente.
Brigando com as pálpebras pra não sonhar que pode ser.
Aprendo a silenciar a boca e o coração.
Que é pra não assustar esse leão.
Assopro conta gotas e bebo dentes de marfins.
Fico muda e mudo a roupa pra brincar de conformada,
de madura. Porque o amor é duro.
Enquanto amar, dura. Amargura.
Meu sol de azulejo.
Você não está disposto e eu não encontro disposição.
De começo todo errado. Enredo de nós soltos.
De nós todos.

domingo, 20 de novembro de 2011

Dor a prazo

É de saudade que morre um coração. E essa distância já acabou com a gente.
Quando sequer houve um nós...
Já me perdi na distância do seu olhar. No sol na minha sacada.
Quantas pessoas no mundo cruzariam fronteiras por um capricho?
É de saudade que morre um coração. Dessa dor de ausência.
Minha falta de ar é o seu silêncio.
Por obséquio, seja sincero de uma vez e detone todas as minhas expectativas.
Não sei conviver com dor a prazo.

A contradição

*

Você coleciona pessoas.
Eu coleciono sentimentos.
Você gosta de coisas finas, de bom gosto.
Eu sou transcendentalmente desprendida.
Você é racional, eu visceral.
Você é equilibrado, eu sou brutal.
Você é um samurai, eu sou um caminhoneiro.
Você conhece o mundo.
Eu vou mastigá-lo sem sair do meu quarto.
Você ama a paz, eu sou o caos.
Seu hobby é dormir, eu sou hiperativa.
Você sempre teve relacionamentos longos,
eu nunca soube ser fiel.
Você é a certeza,
eu sou a antítese, a contradição.

*

Com a alma pelos trilhos...

Eu não quero ser apenas mais um dos seus caprichos de spoiled rich boy. Você é mais velho do que eu, mas não viveu metade dos meus dilemas. Não sou domesticável. Não vou mudar por você. Desapego e paciência são desafios meus. Coisas que você não entenderia. Não me subestime, garoto. Não sou um tipo previsível assumido pelas suas fantasias. Não vivo de imagens. Tenho alma de caminhoneiro, de pirata, e pra me encontrar você vai ter que pisar nessa estrada. Vai ter que enfrentar as piores tempestades. Eu nunca disse que a vida ao meu lado seria fácil e não entendo porque você me seguiu até aqui. Foi por sua própria conta e risco. Não me trate como se já me conhecesse, porque você ainda não entendeu o meu jogo. A verdade é que não jogo e conheço poucos homens de verdade dispostos a enfrentar tanta sinceridade. Conheço nenhum. A vida ao meu lado pode ser brutal, asfixiante. Mas só quem convive com tamanha dor aprende a dominar esse meu tipo de liberdade. Isso não é um recado, é uma advertência. Se você for corajoso como diz, garoto, lhe desejo boa sorte ao meu lado. Vai precisar.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

É de romance...

*

É que às vezes eu acho que posso me comunicar por telepatia com você. Não por idealismo. Simplesmente porque é assim. Antecipo o que vai me dizer, e ainda assim me agrada. Conheço suas novidades por intuição. Seu silêncio responde. Tenho teu cheiro impregnado no sangue. Sua voz que se propaga na minha alma. A delícia dos teus convites e das tuas manias. Frescuras que se entendem com as minhas. Mesmo quando suas expressões são inteligentes e subestimam as minhas. Quando você tem curiosidade sobre minha rotina e sua voz se torna possessiva. Faz aquelas brincadeira mais agressivas. Eu até acredito que essa distância não atrapalha. Mesmo sem enxergar um átomo dos detalhes, quero confiar. Quero que confie. Você diz que me conhece minuciosamente e eu acredito que posso me entregar. Mesmo sabendo que é de romance que eu preciso.

*

Você mastigando meu nome

*

Você me deu essa paz. Essa vontade de ficar deitada na cama contando os dias, até o seu próximo retorno. É como se o tempo não existisse. Sei que os dias passam e que eu envelheço, mas a vida só acontece ao seu lado. Fico buscando em meio a tantas memórias boas o que os seus olhos tentavam me dizer. O coração só aperta de saudade. A diferença é que agora tudo parece certo. Eu espero que realmente esteja. Mesmo quando tudo o que eu tenho é uma porção de letras e palavras esporádicas meramente virtuais. Saber dessa sua curiosidade e dessa sua vontade de regresso me conforta. Eu acredito que pode valer a pena. Tudo isso aqui. Mesmo quando estou em todos os lugares errados. Eu desejei você, desejei sua personalidade, desejei sua inteligência sem limites. Desejei esse interesse todo pelas coisas do mundo. Desejei sua idade e cada um dos seus cheiros. Desejei essa condição forasteira. Desejei seu nome, seus olhos e seu perfil. Desejei cada uma das suas paixões. Alguém me ouviu. Desejei perder o interesse em todos os demais quando eu te encontrasse. Minha alma, sempre tão desleal, se rendeu a toda essa monogamia absurda e fora de lugar, de mão única. Ainda tenho o fôlego e a audácia de desejar mais. Desejo permanecer e que você permaneça. Desejo que esqueçamos nossos velhos medos. Que essa paz resida entre nós. Que você me tatue na sua mente assim como te tatuei nas minhas veias. Que a sinceridade seja forte o suficiente para sobreviver. E que a minha alma possa oferecer a você tudo o que a sua já me deu. Sabe aquele romance da madrugada? Cada uma das suas palavras, das suas lembranças, suas ironias, seus gemidos. Você mastigando meu nome. Quero seu ciúme e sua posse. O carinho perigoso nas minhas costas. Sua manha e suas provocações. Meus caminhos em seus lábios. Meu colo para sua cabeça. Minha cabeça para sua bandeja.

*

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Enquanto Buenos Aires dói no peito...

Tenho as manhãs apegadas aos sonhos. Não distingo o sono da realidade. Ainda mais quando são dias frios assim, nublados e cinzas, como sonhos. Saio de casa lutando para não mastigar os ramos e os galhos das árvores que vejo, enquanto Buenos Aires dói no peito. O fundo do meu olho direito pede silêncio à cidade. Mas tão incrível como é, e como só esse mundo sabe ser, nada silencia. Caminhando descubro egos inflados de Hélio, flutuando e assombrando o que havia de bom na cidade.  As lembranças porteñas cortam meus pulsos. É quando as cores das construções, dos carros, das pessoas, do rio pinheiros, se misturam. Tudo vira um grande cinza petróleo. Mas sem a beleza ou poesia de um filme em preto e branco. Meu sangue escorre pelos meus pés como se fosse confete. Amor aqui não há. É vida que foi pelo ralo. Sigo buscando pessoas que tenham  seus egos menores do que suas idéias. Que saibam que sentir não é coisa pra adolescente. Adultos decentes.  Me encolho nas esquinas mastigando cigarros. Minha fome partiu pra longe. Nem a comida, nem os cheiros, nem os sons, nem as imagens ou as cores, nada disso me apetece por aqui. Eu não faço mais sentido quando penso, menos ainda quando falo. Eu sabia que faltava alguma coisa na minha vida. Sempre soube. O que eu não sabia é o estrago que a ausência poderia causar. Veio e perturbou meu juízo, minha cólera. Arrancou minha língua sem que desse tempo de sangrar. Estancou minhas energias, castigou minhas artérias. Um passo a mais não alcança. Não há rumo a escolher pois todas as ruas foram bloqueadas. As músicas dançam em mim como se meu interior fosse oco. Não importa quantas linhas eu desenhe, quantas folhas eu gaste, quantos suspiros nasçam de pesadelo após pesadelo, a frieza do meu travesseiro e dos meus pés. A lua vai me olhar todas as noites com aquele sorriso gordo e iluminado, toda cheia de si e vai me dizer: você poderia ler um livro embaixo da minha luz. E o apocalipse vai tomar conta do meu peito.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Fui pega.
Me entreguei aos acontecimentos simples. Lugares comuns. Deixei de lado meus sonhos. Quase todos. Me vendi. Aceitei. Não ouço mais meu corpo, nem minhas vontades, meus impulsos. Deixei de existir. Me conformei com todo o resto. Me conformei com dormir, acordar, ouvir o que acontece na novela, me alegrar com os nascimentos dos filhos alheios, trabalhar. Não busco mais. Não tento ver diferente. Entrei para o fluxo daqueles que acordam, correm e morrem. Massinha de modelar. Não lutei pelo meu amor. Não mudei de país. Não tive bolas para largar tudo e escrever um livro. Para viver de arte. Para passar fome por arte. Aceitei o amor que tinha por aí. Qualquer amor, se é que há. Aceitei ser amada pela piedade. Não me reconheço mais, nem minha voz, nem minha pele. Aceito docilmente conversas triviais. Fui domesticada pelo chicote da impossibilidade e da inércia. Deixei carimbarem cifras em todas minhas células. Não penso mais. Não faço mais. Não luto mais. Sofro mais. Sequer existo. Enquanto alguns por aí morrem por viver demais, já morri por viver de menos.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Here

Home is where the heart is.My home is by your side. On your bed. In your heart.That’s why it’s been so cold outside.Our hearts are empty of us.Because what I feel has no words and meaning in any other language.Just like my life here. Without words or meaning. I wanted to know you. Now I can’t forget you.I wish we’ve never met.I’ve stepped into our history with the wrong foot.Some kind of regret. Because it’s impossible to bare the idea of life without you.

La vida es una milonga...

Não quero mais perder as pessoas que eu amo. Todo esse sofrimento a toa. Deus não entende porque ele não tem problemas. O que eu quero, o que eu sempre quis, é muito simples. Mas a solução tem as pernas maiores que as minhas e o tempo tem pressa. Perdi a capacidade de sentir qualquer coisa além desse aperto no peito. Minhas miradas e meus sorrisos são vazios, assim como minhas caminhadas. Tento deixar que o sol me alegre. Tento me conformar com a rotina. Devoro livros, ouço músicas, bato fotos, bato copos, danço até os pés incharem, dou todas as chances que as pessoas me pedem, compro com o dinheiro que não tenho, me importo, dou presentes, crio novas obsessões, passo mais maquiagem, tento substituir as vozes. Nada preenche. É aquela eterna sensação de estar no lugar errado. Vivendo o que os outros querem que eu viva. Sem força de reinventar. Inércia virou sobrenome. É como estar em uma milonga sem par. Há muita vontade de arriscar uns passos, sem conseguir sair da mesa.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Minha história de terr(am)or

Só é necessária a beleza de um dia frio pra eu acordar de dentro de mim.Peço a todos os santos para que você saia da minha cabeça.Não, não precisa sair do coração, mas deve tentar sair da minha cabeça.Não consigo mais me concentrar. Me lembro das calçadas. Dos cachecóis.Do seu agasalho me abraçando naquela noite fria. Sua moto.Sua mão que sabia segurar a minha.Rezo para te esquecer. Pra arrancar sua posição de prioridade na minha vida.Então eu danço. E acredito que o ballet vai me salvar.E muitas vezes salva.O problema é que, em algum momento, sempre tenho que descer da ponta.E é isso que dói. Pisar no chão e lembrar você.Por dois meses sua voz tem sido tudo que quero ouvir.Mas você me ignora muito bem. Vive muito bem. Sem mim.Eu queria saber viver bem e em paz sem você.Cada golpe no contrabaixo, cada alongamento do bandoneon, o castigo do piano.Meus pés sangram porque desaprendi a pisar com segurança.Quero ficar sozinha. Sua presença me assombra. Tirou minha capacidade de sonhar.De dormir.Meu romance se tornou minha história de terror.

sábado, 11 de junho de 2011

Imóveis

Velvet.

Às vezes eu acho que seu segredo residia na forma como você dizia meu nome. Na entonação da sua voz. Um artista da voz. Que me faz derreter cada vez que pronuncia meu nome. Nunca me chamaram assim, com tanta delícia na voz. Com tanto carinho. Quando você me olhava de perfil com cara de quem ia roubar um beijo apaixonado. Mas não podia. Resistia. Enquanto sua mão segurava meu pescoço. E você resistia, e eu resistia. Por medo de tanto desejo, de tanta violência e de tanto sentimento que nascia dentro de mim. E enquanto você se divertia e eu me divertia, fui me entregando aos pouquinhos, sem saber da dor que estava por vir, ignorando toda a insanidade daquela situação. Ignorando que tudo tem um fim. E esquecendo o quanto o fim dói. Aquele começo parecia que seria pra sempre. Eu fiquei bem séria e não te fiz um carinho. No meio daqueles espectadores todos. Fui ignorante. Eu só queria te abraçar, você e sua garrafa de cerveja ansiosa. Eu vi seu perfil na escada me esperando e me analisando. Carente. Eu tive medo. De você, da sua rejeição, de tanta força pulsando em mim. Tive medo da entrega que já tinha acontecido e da falta que você ia fazer depois que chegasse nosso último dia. Então você esfriou. E eu também. Me desesperei. Porque sei que você é do mundo. Como eu. O que eu não sabia é que você ia fazer tanta falta assim. Até hoje. Até agora. E eu não consigo mais seguir um dia adiante sem doer. Sem chorar. Esperando qualquer sinal seu ou divino. Um olá ou um bom dia. Arrependida de todas as coisas erradas que eu disse. De todos olhares errados, para as pessoas erradas. Quando eu juro que minha cabeça e meu peito só pertencem a você. Até hoje, até agora. Eu espero que sua cama me espere, enquanto meu travesseiro sente falta do peso da sua cabeça. Assim como quando eu tentava afastar as horas e os raios do sol, que ameaçavam entrar pela fresta da sua janela, com os pensamentos e ficava tensa. E você notava, sem saber o que fazer, tentando resolver tudo com beijos na minha testa, cabeça, ombros. Insistindo para dormirmos abraçados. Sem ligar para o incômodo do braço. Porque não havia incômodo para nós ali tão dentro daquele abraço. Encontrei finalmente um abraço do tamanho certo e compreendi. Dormíamos imóveis com medo de afastar o momento ou perder os segundos. Muitas vezes eu não dormia e podia sentir a sua respiração na minha nuca, também sem dormir, observando minha alma que tentava não escapar dali. Imóveis.

Sua N.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Plush

Velvet,

Me deu vontade. Quero ser uma pessoa melhor. Quero aprender a cozinhar. Quero ter um filho. Quero
ser mais elegante e mais sutil. Mais carinhosa. Quero ter mais saúde e mais valor. Tão fácil como pedir
com jeitinho. Eu ficaria. Escolheria permanecer. Até colocaria silicone. Sou amável com crianças. Basta
me mostrar que posso confiar. Quero não ter mais medo. Entregar todos os meus pontos. Quero ganhar
mais dinheiro e mostrar mais estabilidade. Quero ajudar e dar colo. Quero me entregar por completo.
Como quase já fiz. Sua cabeça aninhada em meus seios. A temperatura certa da pele. Quente. Amar o
amor de frente. De lado. De bruços. Do avesso. Sua língua em todos os espaços. Meus espaços. Nossas
intimidades. Quero confortar as perdas e celebrar as conquistas. Esperar no retorno de cada viagem.
Quero poder ser franca e fiel e leal. Quero ser tudo. Seu tudo. Porque meu todo é tudo aquilo que você já
conquistou.

N.

Mermaids will always be worse than the pirates.

If I had the chance, I would have loved you for the rest of my existence.
But now I live peacefully alone.
And my existence no te importa um pepino.

Mermaids will always be worse than the pirates.

sexta-feira, 25 de março de 2011

*

Às vezes a saudade é tanta que parece que meu coração vai parar. Acredito que chegou a parar mesmo, em alguns momentos.São todas as saudades acumuladas. Uma risada espontânea. Morder o lábio inferior. Aquela expressão indecifravelmente séria. O perfil irreverentemente sedutor. Não sabia que sua ausência ia doer tanto. Mas é só que o viver junto demais também pode tornar-se insuportável. Eu acabo estragando tudo. Não estou pronta pra perfeição. Não fui ensinada a merecer o amor. Então eu fui te empurrando pra qualquer lado. Eu estava tão acostumada ao caos que confundi aquela paz com algo ruim. Com mau agouro. Acabei destruindo o que havia de mais bonito aí dentro. Não suporto mais a idéia de estar distante. Mas ainda não consigo considerar o conviver. Tenho o peito asfixiado e esmagado por todos os outros sentimentos da vida que a idéia de te contaminar com tanta tristeza dói mais que a própria saudade. A minha ausência veio para te poupar de mim. Para nos poupar. Para me poupar de te perder de uma vez por todas.

*

sábado, 26 de fevereiro de 2011

A pé.

*

Você não entende
Nem nunca vai entender
O que é acordar cedo
E se prostituir
Todos os dias
Sentindo nojo
Vendendo a alma
Por alguns centavos a mais
Pra imbecis que não prestam
Atenção em qualquer palavra
Porque estão olhando para os seus
Seios
Pra garantir o seu sustento
E os dos outros
Você nunca vai entender
O que é ter que engolir
Cada palavra errada
E cada orgulho fútil
Segurar tudo isso goela
Abaixo
Enquanto você sente a raiva
Crescendo
Olhando pra esse monte de
Bolsos cheios e mentes fúteis
Querer tomar um trago
Pra rir e relaxar com os amigos
E lembrar da carteira vazia
E das caras vazias
Do coração vazio
E saber que ninguém ali
Vai compreender sua
Pobreza ou sua carência
E te pagar uma bebida
Você nunca vai entender
O que é considerar a possibilidade
De ir pra casa de madrugada
chorando
A pé

*

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

*


Quero acordar beija-flor
E escutar nada além do som constante
das minhas asas
desenhando o infinito no espaço
quero acordar beija-flor
e só conhecer o sabor
das flores
viver para voar
nada além
abusar dessa minha liberdade
de pássaro
enquanto observo os humanos
em seus aquários-escritórios
em seus aquários-casas
em seus aquários-carros
em seus aquários-pensamentos
quero acordar beija-flor
nada além.


quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Latente

*

Eu só consigo olhar para a paisagem
Porque todo o resto não me interessa.
Nasci em meio aos lobos e sei que
Humano nenhum vai me entender...
Vejo no escuro o brilho dos
Longos caninos brancos
E aguardo meu resgate.
Tenho tentado deixar minhas
Unhas crescerem
Para cavar uma saída
Porque tenho ouvido seu chamado
Mas perdi o tom do meu
Uivo.
Permaneço imóvel
Olhando a lua
E aguardo meu resgate,
Pois sou feita de
Material selvagem
E tudo que tentar me prender
Pede pra me perder.

***




sábado, 29 de janeiro de 2011

Down Fall

*

Foi você quem me olhou daquele jeito
e escolheu puxar papo
Mas fui eu quem amou primeiro
Cada uma das suas palavras
E o som da sua voz.
Então, eu tive que ir
Porque não tinha escolha
Mas a minha escolha,
Mais declarada do que o seu olhar,
Seria ficar ao seu lado
Definitivamente...
E se você tivesse me
Convidado mais uma vez
Para aquela gira pela Europa
Eu teria ido.
Mesmo sabendo que você é menos alto
Do que eu gosto
Ou mais moreno e bruto
do que eu prefiro.
Porque quando eu comecei
A duvidar
Você adivinhou cada um dos medos
E disse todas as palavras certas,
Mais importante do que tudo,
Você lembrou
E mostrou que tudo também
Houvera sido tão importante
para você.
E daí você me incluiu na sua vida
E eu te incluí nos meus sonhos.
Eu sigo ouvindo o som
Daquelas cordas...
Mesmo que elas nunca mais
Vibrem por mim.

*

Em paisagens e pescoços alheios

*

Olhar pro nada
Por horas
É o meu mais novo hobby.
Meu mais novo hobby é
Encarar o céu
Sem perceber que as nuvens mudaram
Passaram
Meu mais novo hobby é
Não querer abrir os olhos
Quando acordo
Early in the morning
É tentar sentir seu cheiro
Em paisagens
E pescoços alheios
É pensar que todo blues
Que eu ouço
Foi feito pra contar
a minha história
Meu mais novo hobby
É só conseguir pensar em champagne
E sexo
Com você
Na minha cama.
E, só às vezes,
É ficar imaginando seu
Corpo nu
Olhando pro meu
Enquanto alheios a nós mesmos
E a todos os outros problemas do mundo
Nós nos perdemos nos mesmos sonhos
E no mesmo sono
silencioso
*

domingo, 23 de janeiro de 2011

*

Por uma carência absoluta e irremediável de nossas almas
nossos corpos fizeram sexo.
Mas amor não havia ali.

*

My eyes are open...

*****

Perdemos contato com nós mesmos e com tudo que é natural.
Invadimos todos os espaços sem respeitar
o que ali havia de verdadeiro
Agora teremos que arcar com essas dolorosas conseqüências
Reconectar
Vocês estão prontos para enxergar o que há além dessa nossa dimensão?

My eyes are open.

Since 1969.

“Walking in Space”

My body
Is walking in space
My soul is in orbit
With God face to face


Floating, flipping
Flying, tripping

Tripping from Potsville to Starlight ["pot"sville]
Tripping from Starlight to Moonville


On a rocket to
The Fourth Dimension
Total self awareness
The intention

My mind is as clear as country air
I feel my flesh, all colors mesh


Red black
Blue brown
Yellow crimson
Green orange
Purple pink
Violet white
White white
White white
White white


All the clouds are cumuloft
Walking in space
Oh my God your skin is soft
I love your face


How dare they try to end this beauty?
How dare they try to end this beauty?


To keep us under foot
They bury us in soot
Pretending it's a chore
To ship us off to war


In this dive
We rediscover sensation
In this dive
We rediscover sensation


Walking in space
We find the purpose of peace
The beauty of life
You can no longer hide


Our eyes are open
Our eyes are open
Our eyes are open
Our eyes are open
Wide wide wide!


*

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

13/01/11

Comprei US$ 900 hoje.
O apartamento está ok, as passagens estão ok.
Eu sigo ouvindo música pop em alemão, tangos e buscando artigos sobre o novo circo francês.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

*
Eu não possuo vida para publicar aqui. Busco festinhas em apartamentos. E pessoas bonitas, para alimentar a futilidade da minha alma. Beleza faz bem. Ilumina, descontrai, relaxa, eleva. Felicidade de baixo custo. As pessoas comentam que esse espaço é um espaço de desabafo. É mesmo. Porque é tudo que posso fazer, ultimamente, desabafar. Hoje o rio está amarelo como bosta de neném. Ver tanta vida correndo lá fora não me fez bem. Quero morar na Argentina, mas ainda não descobri a possibilidade desse acontecimento. As casas lá são grandes e baratas. Construções de bons arquitetos, com pé direito bem alto. Sou apaixonada por pé direito alto. Em Buenos Aires as pessoas sabem dividir o espaço. Das casas, das ruas, das coisas, das pessoas. Aqui não. Aqui ninguém divide espaço. Aqui só roubam e invadem espaços. Eu quero espaço, mas meu chefe tem cabelo de militar e meus cachorros não conseguem passear na rua sem pegar uma doença. Na argentina as pessoas amam cachorros. Aqui, as pessoas ora chutam cachorros, ora agem como cachorros. E eu só tenho esse espaço aqui para desabafo. Só desabafo. Porque não tenho mais vida para publicar aqui.
*

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Rei de mim

*
Quando te conheci
não compreendi a tamanha paz
que você me deu de presente
Paz de acordes mansos de violão
de acordes de baixo e contrabaixo
Acho que tem a ver com aquela calma
que só encontrei dentro dos seus olhos verdes
dos seus olhos de gato
sinceros e doces como os de um cachorro
que você não é
ou da forma que eu gostaria que você não seja
quando eu puder te ver de novo
e olhar bem dentro desses olhos verdes
pra recuperar a minha paz
É que só de pensar em você
já fico entorpecida
e parece que não há problema no mundo
e até acordar faz sentido
mesmo sabendo que posso te ver nunca mais
ou logo daqui a pouco.
Por você, eu até não tenho mais medo de avião.
Porque os seus olhos verdes, e aquela paz dentro deles, me ensinaram a voar.
*