Juro por tudo que me é sagrado que tudo o que eu mais queria (ainda quero) nesse mundo era ser atriz.
Dessas grandes novas atrizes que temos acompanhado já há algum tempo.
Mas meu pai não é músico e minha mãe não tem teatro.
Não há poetas, escritores, pintores, artistas plásticos, almas eruditas em minha família.
Pelo contrário, as pessoas da minha família nem gostam, nem se interessam, nem entendem.
Só há preconceito.
Não temos cabaré. Não tenho apoio.
Sempre gostei de televisão, de filmes, de música, de dança, de propaganda, de desfile, de roupas, de atuações impecáveis, de grandes atores, de arte abstrata, de filosofia, de bastidores, de produção, de espetáculos, de lindas histórias, de livros, de dramas, de intensidade, de poesias, de ler, daquilo tudo que me fazia sentir viva, etc, etc.
Era apaixonada pelas aulas de literatura do colégio.
Muitas coisas me aconteceram entre os 15 e 20 anos de idade que me tiraram de órbita e me fizeram buscar muitas coisas para a felicidade e segurança. Dos outros.
Deixei todas aquelas pequenas pontadas iniciais de paixão de lado. Tinha problemas reais para cuidar. Preocupações reais. Não tinha tempo para mim, para minha cabeça e meus sentimentos.
Sempre apaixonada. Assistindo tudo de longe. Buscando outros sonhos, que não eram meus.
Sempre uma expectadora da vida. Só admirando a arte como uma realidade impossível.
Uma vida inteira assistindo ao circo pelo buraco da lona. Sentindo a arte como uma pessoa cega e surda.
Mas só no ano 2006 que tive um contato com isso.
Um primeiro contato imediato.
Aos 21 anos de idade, com sorte, fui sozinha a um espetáculo chamado "O Cubo", no teatro popular do SESI, na Av. Paulista.
Fui para confirmar as suspeitas de uma vida inteira. Uma vida inteira de expectativas e dúvidas sobre qual era meu lugar no mundo.
Me apaixonei perdidamente. E nunca mais saí de lá. Nunca mais tive coragem de abandonar aquele sentimento que me invadia, e ainda invade, cada vez que eu entrava num teatro.
Aquele amor só crescia.
Passei a ir todos sábados e domingos à Av. Paulista, não perdia um peça. Sabia e conhecia todas exposições by heart.
Quando era um temporada longa, assistia à peça 2, 4, 8 vezes...
Deixava o carro em qualquer estacionamento próximo, e ficava perambulando pela Paulista e arredores. Ia no MASP, via outras exposições no prédio do SESI, assistia aqueles filmes lindos e
cult do cine Bombril, HSBC ou Espaço Unibanco. E, para fechar o dia, ainda assistia uma peça.
Tudo isso sozinha.
Mas plenamente feliz.
De cada peça que eu assistia, procurava saber o nome dos atores, o nome do diretor, do dramaturgo, pegava a peça ou o livro para ler, e ainda divulgava incansavelmente.
Mas continuava sempre sozinha.
Até que um belo dia, no final do espetáculo "Timão de Atenas
", o ator
Renato Borghi divulgou a maratona de Shakespeare que ele e alguns colegas de elenco estavam fazendo e comentou sobre o "Macbeth" que estava em cartaz no
Satyros 1, na
Praça Roosevelt.Fiz o possível para descobrir onde diabos ficava essa bendita praça. Saí do trampo às 17h pra lá do
Largo do Socorro, e enfrentei todo caos da hora do rush de São Paulo, mais uma vez completamente sozinha, chegando à praça quase às 19h. Só para assistir a peça indicada. Foi ótimo, pois eu era péssima motorista e não conhecia nada dessa cidade. Não que eu tenha melhorado muito, mas tudo o que sei hoje e a forma como dirijo devo às arriscadas idas semanais à praça.
Chegando lá, estranhei mas me apaixonei mais uma vez, com mais intensidade. Outra forma de ser platéia de teatro. Contato direto com os atores, teatro mais intimista. Deslumbre.
Minha vida passou a ser assim: teatro da paulista aos finais de semana, teatro da roosevelt durante a semana. Gastos fenomenais com gasolina. Faltas na faculdade, que me trouxeram uma DP como prejuízo. Paixão e amor pelo teatro maiores a cada semana. Felicidade. Crise existencial por achar que tinha perdido minha vida inteira até ali. Que todas as escolhas que fiz foram em vão, pois não eram por mim. Mas sim pelos mais pais. Pelo gosto deles. Pela segurança deles. Pela felicidade deles.
Eu estava buscando algo que eu acreditava que se fizesse teria dinheiro de alguma forma.
Eu achava que era apaixonada pelo que eu fazia. Mas quando conheci o teatro, descobri como eu estava enganada em relação às paixões.
Descobri tarde demais. Com uma vida inteira passada e começada. Sempre fazendo tudo por fazer. Fingindo que gostava para deixar os outros satisfeitos.
Em uma família que ainda não apóia esse novo amor.
No início de 2007, passei a juntar dinheiro e procurei sim um curso de teatro. Fui no primeiro que comentaram comigo e me inscrevi. Aos 22 anos.
Estou cursando teatro atualmente. Mas agora conheço todo um outro lado dessa arte. Com mais informações acerca de estudos, contatos, pessoas e grupos influentes, falsidade do meio, dificuldades, etc, etc, etc.
Estou nisso por pura paixão, por amor!
Sei que não tenho rostinho e corpinho de meninas da
Malhação, sei que posso não ser lá muito talentosa, ou que as pessoas influentes não vão com a minha cara.
Mas enquanto eu tiver esse sentimento tão forte e absurdo aqui no peito, me prometo não desistir. Enquanto eu puder pelo menos ver essas pessoas que tanto admiro, ninguém vai ter força de me tirar desse caminho. Juro.
Que bom para essas pessoas que têm família e amigos na área. Que bom para aqueles todos que ganharam na loteria genética e tem a pele, o tipo e o rosto certos e, por cima disso, talento. Que bom para quem tem papai generoso e cuidadoso. Isso é muito bom, é importante.
Admiro isso sim. Acho bacana. Como o resto dos
mortais.Mas não é porque alguns acreditam que eu não tenha o que é necessário e tentem me convencer diariamente a desistir que isso vai acontecer.
Já abri mão de alguns amores sérios por motivos muito fortes. Mas nada nesse mundo vai tirar
esse amor de mim.
E é só disso que eu preciso.