sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

***

O títere faz piruetas nas mãos de um deus com dois vazios obscuros e cósmicos no lugar dos olhos
Uma bailarina de pernas quebradas tenta se equilibrar sobre suas dores e muletas
Um disco de vinil riscado na penúltima palavra do refrão
Um pianista sem mãos tenta desesperadamente homenagear o filho em seu funeral
Ouve-se o último uivo de um lobo, extinto, enquanto sua casa e filhotes desaparecem sob o fogo criminoso

Pneus de carros que gritam
em freadas bruscas e inesperadas
A visão derradeira de um espetáculo das
pessoas que rodopiam no ar como patinadores de gelo,
antes de arrebentarem seus corpos contra a crueldade do asfalto

Luvas tentam aquecer pontas de dedos
necrosados
Sorrisos sem energia
Congelados
Crianças que nunca viram nada
Nem a praia
Apenas a doçura do chinelo, da cinta, da mão
Do cabo da panela, do fogo, do fogo, do fogo

Uma caixinha de música
A lembrança do sorriso do melhor amigo
Do melhor amor

Cai uma neve fina e ardilosa
Teia de aranha úmida
Reluz como diamante
Como os olhos verdes
E a pele verde oliva
dela

A garota que passeia com os pés em andeor
Roupa colada aos gestos
Delicada,
em contraponto à brutalidade do mundo
À brutalidade das coisas
Porque ela prometeu nunca se render
Nunca se vender
Dolorida e demorada
Em todas as suas coisas
De sono pesado
Vendada
Carrega cicatrizes feias nos braços
De tanto tentar se proteger
Mas alguns estilhaços sempre
Sobram

***

Nenhum comentário: